domingo, 27 de novembro de 2011

Em louvor dos equilibristas - poema de Carlos Loures.

Ilustração capa  Nov 2011 


Era para comentar a ajuda da troika a Portugal, melhor, o custo em euros dessa ajuda, mas como é Domingo, censurei (me). Por outro lado não corro o risco de rasgar o ecrã por causa de algum a(ex)cesso de raiva.


Em vez disso um poema que Carlos Loures fez há uns anos (não sei dizer a data). Tem o título “Em louvor dos equilibristas”, faz parte da colectânea de poemas do autor, O Cárcere e o Prado Luminoso. (Edições Salamandra)

Em louvor dos equilibristas


Falta ainda uma condecoração,
ordem, ou comenda, que consagre
o esforço do equilibrista
em prol da civilização.
Formidável ciclista,
verdadeiro paganini da circulação
em cima do arame,
o equilibrista percorre,
sem qualquer hesitação,
o ténue traço que separa
a esquerda da direita.
É um simples traço,
quase uma abstracção,
um risco passado
por onde não há espaço.
Ágil, aproveita
o espaço inexistente
deslocando o corpo
obliquamente:
metade sobre o risco da direita
e outra debruçada
sobre os riscos da vertente
que à esquerda, sobre o abismo,
espreita.
Mas ouçamos a receita do artista
(que ninguém está livre
de a ter de usar:
quando menos se espera e pensa,
a corda tensa, a pista, a vertigem,
lá estão à espera
dos que não aprenderam a voar).
Diz, com modéstia,
o frágil saltimbanco:
- Afinal nem é assim tão complicado.
Sigo pela direita
quando
ando,
avanço pela esquerda
quando estou
parado.

Carlos Loures


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2 comentários:

Maria Braamcamp disse...

Caro Carlos Mesquita:
Leitora diária dos seus comentários (quase não preciso de ler jornais nem ouvir notícias)pois eles vão ao encontro do essencial do que se passou nesse dia, com eles concordando na sua maoria, ficámos, com os dois últimos posts a conhecer-lhe esta outra faceta,o que vem completar a imagem que fazemos de si. Bela homenagem a Cesariny e belo poema de Carlos Loures, que se nos ler, ficará a saber o que dele penso. E quanto à oportunidade de o publicar agora de novo, nem se fala...

Anónimo disse...

Espero sinceramente não ofender ninguém com o que vou dizer mais nunca fui politicamente correcto nas minhas opiniões

Eu consideraria o Fado como uma das mais belas formas de arte musical (isolado do seu contexto é de uma beleza estonteante) mas infelizmente desde há mais de 30 anos que o sinto como uma romantização de um complexo derrotista e de vitimização.

Sinto que subliminarmente é culturalmente um instrumento umbilical para nos desculpar dos nossos erros e de não conseguirmos deixar de ser um "povo-criança" em que o Pai Destino e Castigador nos domina.

Penso que através do fado - entre outras coisas - o português revê-se numa alegoria simplista e recusa-se a crescer com a "desculpa da culpa" do Destino que cai sobre ele como a Mão de Deus.

O Fado parece somatizar tudo isso e parece só se libertar dessa grilheta doentia que a ele se cola como uma doença terminal, quando este povo souber crescer, ser adulto e tornar-se incorrupto de ideias e valores éticos.
Quando este povo assumir os seus próprios erros e não um masoquismo colectivo à mercê do fado/destino.

Em suma e não por culpa dele mesmo, o fado é a forma poética das tristes conversas na sala de espera dos centros de saúde.

Por vezes pergunto-me se o fado não tem raízes na enorme perda de auto-estima de um povo que viu tudo o que de grandioso atingiu com os Descobrimentos... e depois tudo viu perder para se tornar banal. Então aqui o "destino" seria sempre uma boa desculpa para tão grande e secular falhanço.
Um povo em depressão colectiva, Pós-Descobrimentos, com 500 anos é um povo que precisa do Fado para salva a sua culpa?

Como mencionei esta sempre foi a minha opinião, mas no dia que vir o nosso povo assumir-se como adulto e senhor dos seus destinos, serei o primeiro a amar o fado pois sempre adoreii as suas vozes cantas.

Paulo Mesquita